Micromundos


Falar em excesso nos permite sentir que estamos em casa, onde nos afastamos temporariamente do caos que nos habita. O macromundo, constituído pela linguagem e a opinião, é o nosso cativeiro onde comemos, dormimos, nos distraímos, reconhecemos e somos reconhecidos. A concordância no macromundo ocorre por meio das crenças que conservam a existência do indivíduo e da sociedade. Não queremos negar a importância do macromundo, mas apenas fazer uma observação de que, submetidos a ele, ignoramos a existência de micromundos onde, ao contrário do macromundo, a concordância é imediata, sem intermediários, pois se trata de uma ressonância ou vibração entre micromundos heterogêneos... e para a experiência da ressonância entre micromundos é indispensável o silêncio para ouvir, ver ou, para falar de modo mais preciso, para sentirmos a realidade do micromundo que é, por essência, o mundo do caos. Portanto, nos micromundos não existe reconhecimento, mas ressonância entre micromundos que são demasiado estranhos para uma consciência entupida de significações e de utilitarismo. Para conhecê-los é fundamental esposar-se com o silêncio para operar um banho mental, “como problema social de higiene”, onde a tagarelice humana e o excesso de estímulos das quinquilharias tecnológicas são, finalmente, suspensos. “Prefiro o canto dos pássaros, o som que vem do mar. E o silêncio interrompido por quem sabe falar”. Aqui, extrair riquezas é, desde sempre, permitido: ser capaz de sugar Nietzsche, Spinoza, Bethoveen, até uma folha ao vento, são provas de força e coragem; ao contrário, sem dúvida, daquilo que é característica do macromundo, onde todos supostamente se entendem pela via da opinião, o que não os impulsiona à criação: tagarelar sobre Nietzsche, Spinoza, Bethoveen, até sobre uma folha ao vento, são provas de fraqueza e covardia...

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Aforismo publicado no livro Singularidades Criadoras (2014), de Amauri Ferreira.

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