Educação


Os estudantes que estão ávidos para acessar alguma teoria que pretendem aplicar, raramente chegam a questionar os motivos que os determinam a se prepararem durante anos para poder reproduzir, da maneira mais eficiente possível, aquilo que aprenderam nos seus anos de estudo informativo. Queremos dizer, com isso, que não podemos dispensar um tipo de ensino que seja distinto do ensino oficial. Portanto, é necessário que o estudante tenha uma “autodisciplina”, um certo esforço que seja suficiente para escapar da disciplina imposta pela educação oficial, até que, enfim, ele se torne capaz, de acordo com suas necessidades, de viver sem se submeter à transmissão de informação das escolas – embora seja possível, é certamente difícil que esse estímulo para encontrar as ideias que são as mais preciosas para a vida de alguém possa ocorrer entre os muros da escola... Já disseram que a criança precisa de espaço para correr, de árvore para subir, de rio para mergulhar, ao invés de ficar confinada várias horas num ambiente que lhe é hostil, durante os anos mais exuberantes da sua existência. Não dar mais prioridade às informações que são impostas burocraticamente na sala de aula é uma via importante para quem deseja sinceramente o conhecimento, seja na idade em que estiver. A diferença é enorme: o conhecimento do que acontece com alguém, o conhecimento das ideias que brotam em alguém e o conhecimento dos anseios de alguém se distinguem totalmente do conhecimento que é distante da vida de alguém, por simplesmente ser imposto para todos obedecerem. A repressão do corpo e da mente que os alunos sofrem durante uma parte considerável dos seus dias, seja através do confinamento (que produz afetos de entristecimento, tédio, ódio e também o bullying), seja através do controle das horas de estudo fora da escola (que roubam o tempo da experimentação), apenas os mantêm distantes de experimentarem um amor que redime o homem da sua existência triste, que é o amor ao conhecimento, pois somente através desse amor o homem passa a zelar por seus momentos de estudo e de experimentação, e de também perceber a educação como processo vital da sua existência, e não como obrigação de conhecer algo para poder chegar a algum lugar ou para ter alguma vantagem na concorrência pelos “melhores cargos”, mas para viver com maior força, inventivo e cada vez mais capaz de transformar a si e o ambiente em que vive. Num caso, o estudante é um mero reprodutor de informação, inofensivo e dócil; no outro caso, o estudante permite que a vida gere ideias através dele (a sua dedicação aos estudos permite que tenha essa aliança criadora com o pensamento), por isso seu conhecimento é fruto daquilo que apenas aconteceu com ele – o conhecimento une-se aos acontecimentos da sua existência... Num caso, o conhecimento está alheio às questões mais essenciais da humanidade porque o estudante, independente da sua classe social, é severamente preparado para ser apenas mais uma peça da máquina de reprodução do atual sistema econômico; no outro caso, o conhecimento está diretamente ligado à pele e ao coração dele, por isso tem necessidade de continuar a conhecer o que, para ele, é a razão para continuar vivendo. Ser apenas um reprodutor de um saber é o destino de muitos estudantes intoxicados pela educação oficial, que os tornam ignorantes de si mesmos – libertar-se desse terrível sistema de “ignorantização” humana através da “democratização do ensino” é, evidentemente, muito complexo, já que envolve muitos fatores, acasos, encontros alegres com lugares e com gente disposta a ensinar e aprender de outro jeito, além da coragem de seguir os seus instintos, ou seja, de ler aquilo que deseja, que mais combina com sua vida, de escrever aquilo que pensa, de dizer o que nasceu das suas experiências. Enquanto a educação estiver separada da vida, haverá apenas uma sombra do conhecimento dela, e os estudos continuarão associados com sentimentos de repressão, de fadiga e de tristeza. Quem se alegra com o conhecimento, quem vive para ele, vive também para disseminá-lo – e busca redimir o conceito de educação ao lhe dar um novo e nobre sentido.

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Aforismo publicado no livro Singularidades Criadoras (2014), de Amauri Ferreira.

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